quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

UMA REFLEXÃO SOBRE O MAL E O BEM



Embora em constante mutação, o Universo tem uma característica notável; a permanência da ação das leis. A matéria orgânica, por exemplo, se mantém coesa enquanto nela existir vida. Tão logo a força vital a abandone, começa a desagregação das moléculas e o retorno ao estado original dos elementos. Se nenhuma vontade interferir, “a Terra e o Universo vão cumprindo seu destino”, como bem diz a Desiderata. A evolução se dá em ciclos de diferentes durações, em obediência a uma espécie de regulamento cósmico. Ou seja, se o homem não existisse, a Terra e o cosmo continuariam existindo.

Mas o homem existe e, dos seres vivos, é o único que tenta impor sua vontade à ordem natural, graças ao arbítrio relativamente livre de que dispõe, além da autopercepção e as faculdades mentais que resultam na chamada racionalidade. Sua compreensão da realidade é circunscrita aos limites dos sentidos, que formam um arquivo de impressões para situá-lo no meio em que habita. Quente, frio, sombra, luz, dor e prazer, fome e saciedade, seriam talvez as primeiras balizas de interpretação da vida.  Ora, os sentidos funcionam segundo as mesmas leis que regem o restante do conjunto. É por eles que o ser vivo tem consciência de quando alguma coisa fugiu à harmonia geral do funcionamento fisiológico, do que é avisado pelo alarme da dor. Certamente, a dor, o desconforto em suas gradações mais contundentes, foi a primeira noção de “mal” para o homem primitivo. Por oposição, o “bem” era o estado de harmonia, prazer e saciedade.

Com o desenvolvimento do intelecto surge a organização comunitária; com esta, as regras de convivência e respeito aos territórios individuais ou coletivos. Estas regras vieram como fruto de experiências, por vezes desagradáveis, que provocariam o nascimento dos embriões do senso ético; mais tarde seriam revistas, ampliadas, aperfeiçoadas, no compasso da evolução mental e emocional.

A vida em comunidade implica na manutenção da segurança dos indivíduos diante dos perigos naturais ou provocados, obtenção do sustento e abrigo, medidas que visam manter a harmonia física e emocional. E neste ponto da evolução brota o conceito de “crime”. Sempre que um indivíduo ou grupo contrariassem alguma dessas premissas, expondo os demais à insegurança e à dor, estariam infringindo as regras máximas da comunidade e, consequentemente, praticando o “mal”.  Nesse contexto, por exemplo, apropriar-se dos pertences de outrem sem o seu consentimento é “roubo”, e seus praticantes, “ladrões”. 

E eis a grande pergunta: o ser humano primitivo praticava o “mal” por desejo consciente de prejudicar o semelhante ou por ainda não saber lidar com as regras de convivência que ele mesmo criou?

E nos dias de hoje, milhares ou milhões de anos desde as cavernas, já nos educamos interiormente a ponto de reconhecer a totalidade do direito alheio?

Considerando que a natureza não tem compromisso com as regras humanas e cumpre fielmente seu papel de reguladora da matéria, podemos inferir que há criações “boas” e criações “más”?

Não seria plausível admitir que o “mal” é criação do homem, em face de sua atual incompreensão das Leis naturais, especialmente em relação à vida?

Auro Barreiros
2010

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