sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

AS DUVIDOSAS RAZÕES DA GUERRA




Embora bem menos aparelhado para o combate do que a grande maioria dos animais, o homem é, talvez, o mais belicoso de todos. Desde a idade da Pedra, guerrear, para ele, é tão ou mais importante que viver. Lutava-se por comida, por cavernas, por fêmeas (estas, desde então, já costumavam ser o centro de enormes conflitos). No entanto, é até compreensível que, “num mundo de feras e de presas”, a sobrevivência tivesse por preço a violência.

Porém, à medida que o intelecto expandia suas fronteiras, as motivações da guerra adquiriam novas nuances. Já não se combatia apenas por si, mas pela prole ou pela tribo. Não eram defendidas apenas a comida e as cavernas, mas uma embrionária unidade social.

E assim foi durante muito tempo na História da evolução humana. Até que, finalmente organizados como nações, habitando cidades e ostentando admirável articulação de idéias, os humanos (nós) começaram a fazer da guerra uma atividade emblemática. O guerreiro passou a ser não apenas o defensor dos interesses pátrios, mas o ícone da juventude e orgulho da sociedade, tanto quanto sua espada fosse capaz de fazer estragos. Mas, como os inimigos também cresciam em número e truculência, o bom-senso criou a política, como ardilosa mediadora, capaz de estabelecer pontes entre os inconciliáveis.

Só que nem mesmo a política foi suficiente para aplacar a sanha guerreira da humanidade. Assim, muitas vezes em meio a mais modorrenta paz, um repentino tinir de ferros anunciava o retorno daquela que nunca havia se ausentado. Para que isso acontecesse era imprescindível um motivo justo. E os motivos mais estapafúrdios, infantis ou hipócritas deram ensejo às mais horrendas batalhas e carnificinas registradas pela História.

Nos tempos bíblicos, por exemplo, uma simples desobediência a alguma lei religiosa motivava verdadeiros massacres, como os que teria promovido Moisés durante a travessia do deserto, conduzindo o povo hebreu. Por algumas inocentes noites de amor entre uns poucos casais de tribos diferentes, mais de vinte mil foram passados a fio de espada (Números, 25, 1 a 9). 

Às guerras de conquista, destinadas a ampliar fronteiras, sucederam as guerras religiosas. Estas tinham razões de ordem subjetiva; meu deus é maior ou mais verdadeiro que o deus do meu vizinho. 

A Idade Média, também chamada Idade das Trevas, foi grandemente prolífica em guerras santas. A primeira a ganhar notoriedade foi a repressão aos Cátaros, simplesmente por não interpretarem as Doutrinas cristãs da forma prescrita pela Igreja Católica da época. Não concordar, naquele tempo, equivalia a ser inimigo, e os Cátaros foram sucessivamente massacrados por exércitos organizados pela coroa e pelo clero, até seu completo extermínio. Acredita-se que mais de 60.000 morreram apenas na primeira investida, contra a aldeia de Bèzier, norte da França. Posteriormente, após a Reforma, novos conflitos entre católicos e protestantes marcaram indelevelmente a memória dos povos europeus. E tudo porque Lutero não concordava com a venda de indulgências e outras inexplicáveis atividades remuneradas em nome da fé.

Os tronos, ah, os tronos!.. O insopitável desejo de assentar-se em um deles já rendeu pelejas memoráveis, desde os tempos do Império Romano ou certamente desde muito antes. Parentes que assassinavam parentes, filhos que envenenavam pais, sobrinhos que apunhalavam tios, etc, etc...

E a era moderna, plena de conhecimento e civilização, nos brinda com um desequilibrado que cisma em purificar a espécie humana. Como? Simples. Se não for “ariano”, mate-o. Com essa lógica milhões de judeus foram para as câmaras de gás, sem falar nos milhares de combatentes de diversas nações que se envolveram na Segunda Grande Guerra e pereceram nos campos de batalha.

Imaginem a situação: uma cidade milenar, algumas vezes invadida e vilipendiada, cuja história se confunda com a saga de três das maiores correntes religiosas do planeta. Essa é Jerusalém, sagrada para judeus, que ali tiveram seus reis e profetas; para cristãos, que a têm como palco dos acontecimentos mais significativos da vida de seu inspirador; e para muçulmanos, que também afirmam que por ali andou o seu profeta maior. Nada de mais, se entre todos reinasse a sadia tolerância. Mas a chamada Cidade Santa é, desde longa data, o cenário de sangrentas provas de fanatismo, oriundas de todas as facções, tanto e de tal forma que, provavelmente, ninguém por lá saberia explicar com clareza o motivo de tão acirrado ódio.

E ainda tem o petróleo. O combustível da modernidade, se por um lado veio facilitar a vida e trazer algum conforto, por outro lado é uma das mais freqüentes causas de vergonhosas invasões sob pretextos cabulosos e não-provados. Vide a recente “guerra” no Iraque, patranha capitalista ainda entalada na garganta de muita gente.

Mas a pior de todas as guerras é aquela que se faz para girar os estoques de armamentos. Afinal, o comércio depende do consumo e, para haver consumo é preciso que haja procura. E se a procura não acontece naturalmente, os “senhores da guerra” dão uma forcinha, fazendo uma intriga aqui, derrubando um governo ali, assassinando um líder político acolá e fomentando o patriotismo cego das massas. É a lei do mercado.

A vida humana? Apenas um detalhe.



Auro Barreiros
10/8/2009


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