Quando
conhecemos alguém que raramente comete deslizes, que não se dá a excessos, que
mantém relativo controle sobre suas emoções e evita maiores comprometimentos,
costumamos dizer que se trata de uma pessoa equilibrada. Da mesma forma, o
homem ou a mulher cujo comportamento extrapola os limites do convencional são
vistos como desequilibrados. Mas, afinal, o que é o equilíbrio? Em relação à
vida humana, o que significa essa palavra?
Primeiramente,
consideremos a definição formal de equilíbrio: “Estado de repouso de um corpo solicitado por várias forças que se anulam.
Posição estável do corpo humano. Exibição acrobática. Ponderação, calma,
prudência: equilíbrio de espírito. Justa combinação de forças, de
elementos”. Esta sequência de conceitos
denuncia a velha dificuldade humana quanto às palavras. No primeiro caso, se um objeto qualquer for
submetido a forças iguais em sentidos opostos, permanecerá em equilíbrio, ainda
que debaixo de pressões conflitantes. Na “justa combinação de forças” não se
sabe em que proporção cada força pode ser considerada justa.
Passemos, então, à definição que se refere mais
diretamente ao ser humano: “ponderação, calma, prudência”. Aqui, como podemos ver, o equilíbrio
emocional é conceituado pelo senso comum. Quem aparenta calma é tido como
equilibrado. Na natureza, porém, não é o equilíbrio (equivalência de forças)
que produz movimento e vida, mas exatamente o rompimento dessa equivalência. As
águas correm para o mar porque o mar está abaixo do nível das nascentes. A
energia elétrica aciona máquinas e acende luzes devido à diferença de potencial
entre as polaridades.
Com o ser humano não é diferente. Os potenciais
psíquicos que determinam as manifestações emocionais e criativas permaneceriam
estagnados como um lago, se não existisse um vazio, um declive ou uma “força
oposta” que os obrigasse a fluir. Se nossos atributos espirituais fossem
“submetidos a várias forças que se anulam”, nenhuma produção intelectual,
artística ou humanitária aconteceria. A evolução não aconteceria. Assim,
imaginar que a repressão das emoções, a imposição do autocontrole sejam
demonstrações de equilíbrio é desconhecer as necessidades legítimas da alma: a
livre expressão dos sentimentos, a livre apreciação da realidade, a livre
aceitação ou rejeição daquilo que sua consciência determine.
O estado ideal é aquele em que a vida emocional não
seja regulada pelas convenções, mas pela relação harmônica entre a natureza
exterior e a natureza interior; que possamos nos alegrar com que é belo, bom e prazeroso ou nos entristecermos com o
que seja oposto a tudo isso, com a mesma liberdade, sem que a alegria gere
culpa ou a tristeza seja interpretada como pagamento de pecados.
É evidente que todo excesso é indesejável. Mas o
progressivo conhecimento de nossa própria constituição psíquica nos oferece os
mecanismos de moderação que nos permitam uma vida emocional sadia. A justa
distribuição de nossas forças interiores estabelece a condição que os místicos denominaram
“Harmonium”. Diferentemente do
equilíbrio como oposição de forças com vistas à neutralidade, o “Harmonium” é a
livre, porém ordenada relação entre essas energias, para uma existência plena
de saúde, criatividade e paz no convívio com os semelhantes.
Auro Barreiros
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